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Militante do PSOL do Paraná envia carta aberta a deputados pela descriminalização

O antropólogo Mauro Leno Silvestrin, militante do PSOL e integrante da Primavera Socialista no Paraná, decidiu enviar para os deputados estaduais, nesta quinta-feira (23), uma “carta aberta” em que comemora […]

Publicado em: 23/02/2023

Atualizado em:23/02/2023

Militante do PSOL do Paraná envia carta aberta a deputados pela descriminalização

O antropólogo Mauro Leno Silvestrin, militante do PSOL e integrante da Primavera Socialista no Paraná, decidiu enviar para os deputados estaduais, nesta quinta-feira (23), uma “carta aberta” em que comemora […]

Publicado em: 23/02/2023

Atualizado em:23/02/2023

O antropólogo Mauro Leno Silvestrin, militante do PSOL e integrante da Primavera Socialista no Paraná, decidiu enviar para os deputados estaduais, nesta quinta-feira (23), uma “carta aberta” em que comemora a promulgação da “Lei Pétala”, PL que contém avanços em relação à descriminalização da cannabis medicinal no Estado. No texto, ele narra, também, como foi a experiência de ter levado sua filha, de 10 anos, para assistir pela primeira vez à uma sessão na Assembleia Legislativa.

Silvestrin participa do Coletivo Marcha da Maconha de Curitiba e é membro do Setorial Antiproibicionista do PSOL. No texto enviado aos parlamentares, ele explica que a Lei Pétala leva o nome de uma criança paranaense usuária de cannabis medicinal e ressalta que leis semelhantes já tinham sido aprovadas em outros Estados.

Leia abaixo a carta de Silvestrin na íntegra.

Aprovação e promulgação da Lei Pétala: pequena missiva de um cidadão agradecido

Caros Deputados e Deputadas Estaduais do Paraná,

No dia 06 de dezembro de 2022, experimentei algumas alegrias: pela primeira vez, levei minha filha para acompanhar, de pertinho, uma sessão legislativa. De quebra, assistimos logo duas, já que em breve os deputados e deputadas estariam de recesso, e as pautas – com alguns jabutis e “maldades” – eram extensas. Foi um bom aprendizado para uma criança de 10 anos. Riu ironicamente de alguns defensores de golpes, aplaudiu falas pontuais, seguiu o placar atenta a cada proposição.

Mas nosso objetivo ali era outro: acompanhar a votação da Lei Pétala, que facilita o acesso à cannabis medicinal no estado. Há mais de duas décadas dedicado à luta por políticas públicas sobre drogas mais racionais, tive a felicidade de – nas últimas semanas e representando o Setorial Antiproibicionista do PSOL/PR e o Coletivo Marcha da Maconha Curitiba -, participar de uma Força Tarefa composta por médicos, advogados, pacientes e familiares, e membros da sociedade civil para, de gabinete em gabinete, realizar a necessária tarefa de sensibilização e convencimento dos senhores e senhoras a respeito desta pauta tão sensível e urgente. Afinal, quem tem dor, quem sofre, tem pressa!

A Lei Pétala – que leva o nome de uma criança paranaense usuária de cannabis medicinal -, é necessária para abreviar os caminhos para acesso aos medicamentos produzidos a partir da planta, diminuindo tempos e custos de judicialização, e abrindo mais caminhos para uma futura legislação federal que regule o acesso por meio dos sistemas de saúde públicos. A propósito, o PL 399, que se atém a isso – de relatoria do Deputado Federal Luciano Ducci -, já se encontra tramitando no Congresso Nacional. Importa lembrar que leis semelhantes já foram aprovadas em outras unidades da federação.

Mas a Lei pétala também foi e é extremamente importante no sentido de propiciar o debate e sensibilizar a população paranaense para os inúmeros benefícios deste vegetal, tão demonizado no último século de Guerra às Drogas.

Naquele dia, tivemos um pequeno resultado desta sensibilização: por 36 votos a 4, a Lei Pétala foi aprovada, para vibração dos muitos militantes e pacientes que estavam nas galerias desta casa. No segundo turno, dias depois, o placar foi ainda mais elástico. Vitória de uma mobilização coletiva, mas principalmente, vitória da ciência, da saúde pública, daqueles que necessitam alívio e lenitivo para suas dores do corpo e da alma.

Esta semana, no dia 13 de fevereiro de 2013, e diante da inação do governador Ratinho Junior em sancionar a lei, ela foi promulgada pela Assembleia Legislativa, em cerimônia que contou com os autores e co-autores da mesma, alguns parlamentares afeitos à causa e a sociedade civil organizada, pais, mães e pacientes, e demais instituições ligadas à causa. Novamente, eu estava lá com minha filha, que fez questão de retornar àquela casa de leis para ver finalizados nossos esforços nesta etapa da luta. E para comemorar, claro!

Diante da aprovação e promulgação do tema, gostaria humildemente de prestar meus agradecimentos:

Ao Deputado Goura, querido amigo e proponente da lei, cuja aprovação coroa uma trajetória iniciada ainda enquanto vereador de Curitiba, quando capitaneou as primeiras audiências públicas e discussões sobre o tema, passando pelos espaços de discussão que gerou na Assembleia Legislativa, pelo Fórum Paranaense da Cannabis Medicinal e outras iniciativas correlatas. Em todas estas iniciativas, sempre fez questão de ouvir a nós, usuários, afinal, nada sobre nós sem a nossa presença! Ouviu também pacientes, estudiosos, associações e todos aqueles que possuem conhecimento para contribuir com o debate informado e livre de tabus. E, especialmente, teve a coragem de pautar e sustentar questões que a muitos ouvidos e corações jamais fariam eco.

À Pétala, que simboliza tantos e tantas pacientes de cannabis medicinal no nosso estado, e a seus pais Marco e Pérola, que abraçaram esta causa com muita dedicação.

Aos deputados que relataram o projeto nas Comissões de Constituição e Justiça e de Saúde, e se tornaram coautores do mesmo, defendendo-o de maneira exemplar.

Ao líder do governo na assembleia, que em seu posicionamento e orientação de voto, emocionou a todos com sua defesa do direito à vida e à dignidade dos pacientes da cannabis medicinal, e apelou a seus pares que votassem com coração e empatia.

Ao ex-deputado Galo, que nos recebeu em seu gabinete para um excelente bate papo, e que estava de meias verdes no plenário. Entendemos sua mensagem subliminar, e agradecemos seu voto favorável. Conte conosco para qualquer dúvida sobre o tema.

Ao Deputado de cognome “soldado”, que mesmo demarcando sua posição contrária ao uso recreativo, teve a sensibilidade de votar favorável ao projeto de lei. Agradeço, através dele, os demais deputados que compartilharam o mesmo posicionamento. E faço a todos estes o convite que fiz ao nobre deputado supracitado, rapidamente e ainda do balcão: apareçam na próxima Marcha da Maconha, para que possamos continuar o processo de sensibilização a respeito da falida política de Guerra às Drogas. Afinal, nós, maconheiros, sabemos muito bem discernir os espaços que ocupamos, e separar as pautas para que nenhuma saia prejudicada. Queremos sim nosso direito de usar cannabis, de maneira adulta e recreativa, sem com isso soframos sanções penais ou preconceitos de qualquer tipo, mas jamais seremos negligentes ou inconsequentes para com aqueles que dela necessitam para tratamento de saúde.

Em dezembro, estávamos lá, nas galerias e balcões, vibrando pela conquista dos tantos usuários medicinais. Na Marcha, comemoramos as pequenas conquistas globais dos que lutam contra a criminalização de um vegetal de relacionamento milenar com a espécie humana, e demarcamos nosso espaço de disputa por políticas públicas embasadas em dados concretos e na ciência. Na próxima Marcha, todos os parlamentares serão muitíssimos bem-vindos e bem-vindas, e estamos à disposição para construir mais espaços de diálogo.

Diálogo este cuja sociedade paranaense já parece perceber a importância, dada a expressiva votação de hoje. Por óbvio, pacientes que passam de 80 convulsões semanais para nenhuma, após início do tratamento, e que sofrem com a inação estatal no acesso aos seus medicamentos, comovem muito mais – em um país estruturalmente racista e segregador -, que 29 corpos negros em uma comunidade pobre carioca, mortos (estes, por sua vez), por ação do estado. Ou que quatro adolescentes chacinados no Parolin, pelo monopólio estatal da força. Ou que uma comunidade inteira em chamas, às vésperas do natal – também, adivinhem -, por ação de agentes do estado.

Não ignoramos nenhuma destas dores, mas é preciso não ignorar também que todas estão umbilicalmente ligadas. Cannabis é Maconha, e ponto! A proibição de um tipo de uso impacta no acesso e pequisa de outros tipos de uso, entre outras questões profundas que não cumpre abordarmos aqui. A Marcha da Maconha Curitiba foi pioneira em levantar o debate da Cannabis Medicinal, desde sua primeira edição, em 2007. Afinal, como dizia uma das faixas em nossa última edição, “todo uso é terapêutico!”.

Agradeço, também, imensamente a todos aqueles que dispuseram seu tempo para discutir e atuar pela aprovação da Lei Pétala! É uma conquista de toda a sociedade paranaense, mas que foi construída por muitas mãos e cabeças sensíveis, das quais me jacto da amizade de algumas. É uma satisfação dividir trincheiras com vocês!

Saí da Assembleia, naquele dia de dezembro, feliz.

Também feliz – e já no carro, retornando pra casa -, minha filha me diz: “Mas eu só fiquei meio triste, pai, de saber que mesmo todo mundo falando da importância da lei para a saúde, para a vida de pessoas, de crianças, ainda teve quem votou contra.”

Agradeço inclusive a estes deputados contrários à lei, por demonstrarem para minha menina que preconceitos (muitas vezes embalados em fake news e desconhecimento) quando arraigados, endurecem mentes e corações.

Que não seja necessário, mas, se um dia, eles próprios ou algum parente destes nobres deputados necessitarem de tratamento a partir da cannabis medicinal, espero que tenhamos – nós, os maconheiros -, vencido outras batalhas como a da Lei Pétala, e eles possam ter prontamente aliviadas suas dores, afinal, não é lícito negar a ninguém o seu remédio.

Agora, no comecinho deste ano de esperança, abrimos mais uma pequena fresta para que entre luz e racionalidade no debate sobre drogas e saúde pública. A Lei Pétala elimina alguns trâmites e torna mais fácil e rápido o caminho de quem utiliza ou utilizará remédios à base de canabinóides, mas ainda não evita a judicialização. Nem torna acessível via sistema público de saúde o tratamento a todos os que necessitam. Ainda teremos batalhas e vitórias pela frente. Mas não temos dúvida: também veremos, nestas veredas tropicais e a despeito de todo propalado “conservadorismo” da população brasileira – um tremendo engodo -, a canábis medicinal distribuída pelo SUS.

Sim, não haverá equanimidade nem justiça social na distribuição e acesso aos tratamentos com canábis se não existir este exemplo pro mundo que é nosso Sistema Único de Saúde, consagrado pela CF88, e que será mantido e melhorado pelos esforços de milhares de combatentes cotidianos. Nenhuma luta é isolada das outras, e assim como o efeito entourage/comitiva da canábis – onde a multiplicidade de canabinóides e terpenos interagindo amplifica e modifica os efeitos -, juntos alcançamos resultados melhores.

Viva o SUS! Viva a Canábis Medicinal! E viva a luta e organização popular. Aos poucos, trataremos de redimir esta planta múltipla e fantástica, que foi injustamente criminalizada, e que agora descortina novos horizontes médicos e farmacêuticos. A maconha é a penicilina deste século. Que avancemos, enquanto sociedade e na nossa relação com esta planta, tanto quanto o conhecimento médico sobre ela tem avançado nestes últimos tempos. Que ninguém mais sofra por distúrbios tratáveis com a planta, mas que ninguém mais morra por carregar uma furadeira, um guarda-chuva ou mesmo um baseado, nas nossas comunidades carentes expostas à violência estatal. Por doença ou por balas, basta de choro e sangue na nossa relação milenar com a maconha!

Mauro Leno Silvestrin

Antropólogo,
membro do Setorial Antiproibicionista do PSOL/PR
e do Coletivo Marcha da Maconha Curitiba.

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