O deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) recebeu, nesta quinta-feira (30), o pedido de desculpas oficial do Estado brasileiro por ter sido torturado no período da ditadura empresarial-militar, que vigorou no Brasil entre 1964 e 1985. O perdão aconteceu durante a 1ª Sessão da Comissão de Anistia, que foi recomposta em 2023 pelo ministério dos Direitos Humanos e Cidadania.
Ivan tinha tido seu pedido de anistia recusado durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), quando pessoas que negavam a existência da ditadura e da perseguição política tomaram conta dos trabalhos na Comissão de Anistia. Com a volta de conselheiros que prezam pela democracia e valorizam a memória, a verdade e a justiça, o caso do psolista foi novamente julgado. Além do parlamentar, outros três requerimentos de anistia também foram analisados e concedidos na mesma sessão.
Durante a ditadura empresarial-militar, Ivan integrava o Movimento de Emancipação do Proletariado (MEP) quando, em 1977, foi preso e torturado pelo Estado brasileiro. Ele foi um dos prisioneiros emblemáticos do período, já que conseguiu, junto com outros companheiros, fazer com que fosse publicada em jornais a primeira carta descrevendo os horrores que aconteciam nos porões do regime. “Os punhos cerrados ficarão em nossa memória, e amanhã, mais do que hoje, serão um pesadelo para os ditadores e seus sequazes”, dizia o trecho final da carta publicada pelo grupo de presos políticos do MEP.
“Fui fotografado, deixado nu e encapuzado. A partir deste momento, fui submetido a 10 dias seguidos de torturas que envolveram choques elétricos permanentemente. (…) ‘Pau-de-arara’ e o chamado ‘telefone’, asfixia com saco plástico ou com o próprio capuz, também foram utilizados”, contou Ivan Valente em 2004 sobre o período em que ficou preso. “Um pneumologista constatou deficiência respiratória causada por violentas pancadas no tórax, ocasionadas pela aplicação da modalidade de tortura denominada ‘cruz’, onde o preso com os braços abertos recebe violentos golpes no peito”, completou. Ele conta que tem sequelas no joelho esquerdo até hoje, por ter tido os ligamentos partidos por conta das pancadas que sofreu.
Na sessão da Comissão de Anistia desta quinta, o pedido de Ivan Valente foi deferido por unanimidade entre os membros do colegiado. Ao final da leitura do processo por parte do conselheiro relator, a cerimônia seguiu para discursos e posteriormente para a votação. Ao final, Ivan foi chamado ao palco para que o pedido de desculpas do Estado brasileiro fosse feito, por meio da presidente da Comissão, Eneá de Stutz e Almeida.
“Senhor Ivan, nesse solene momento, eu oficializo o pedido de desculpas em nome do Estado brasileiro por todas as perseguições que fez ao senhor e a sua família, por todas as agruras que o senhor passou e por todas as mazelas que decorreram. Agradeço muito ao senhor pela sua luta, pela sua história, pelo seu exemplo, pelo seu heroísmo, pela sua resistência, por nos deixar esse legado, por nos ensinar tanto com a sua vida, com a sua biografia. Então eu oficializo o pedido de desculpas. Foi um erro que o Estado brasileiro cometeu e voltou a cometer no ano passado, quando responsabilizou o senhor pelas perseguições sofridas. Isso é uma crueldade, isso é um absurdo e isso nunca mais pode acontecer. Então, nos termos do voto do conselheiro relator, eu declaro o senhor anistiado político brasileiro. Muito obrigado pela sua luta”, disse Eneá.
Nas redes sociais, Ivan escreveu: “Finalmente o reconhecimento e pedido de desculpas do Estado Brasileiro pelos crimes cometidos durante o período da ditadura civil-militar no Brasil. Tortura Nunca Mais! Ditadura Nunca Mais! Democracia Sempre!”.
Assista no vídeo abaixo à sessão na íntegra da Comissão de Anistia. O julgamento do requerimento de Ivan Valente pode ser encontrado entre o tempo 3:16:47 e 4:25:00.